quarta-feira, junho 20, 2012



Nenhum grupo ou fação de Irmãos se retirará ou se separará da Loja em que foram iniciados, ou admitidos como membros, a não ser que a Loja se torne demasiado grande, e, mesmo assim, só com autorização do Grão-Mestre ou seu Vice-Grão-Mestre; e quando tais Irmãos se separem, devem imediatamente filiar-se noutra Loja, que mais lhes aprouver, com o consentimento unânime dessa mesma Loja à qual se ligarão (como regulamentado acima), ou então devem obter permissão do Grão-Mestre para a formação de uma nova Loja. Se algum grupo ou fação de Maçons se decidir a formar uma Loja sem a permissão do Grão-Mestre, as Lojas já formadas não deverão apoiá-los nem reconhecê-los como legítimos Irmãos ou considerar a Loja como devidamente formada, nem aprovar os seus atos ou conduta, mas tratá-los como rebeldes até que se submetam, na forma que o Grão-Mestre, em sua grande prudência, decida; e até que os aprove, concedendo-lhes patente, a qual deve ser comunicada às outras Lojas, como é de costume quando uma nova Loja é registada na Lista de Lojas.


Esta regra prevê a proibição do que em termos maçónicos é designado por Lojas Selvagens, isto é, a constituição de Lojas à revelia da Grande Loja. 

Destina-se, por um lado, a prevenir a resolução de possíveis conflitos ou divergências numa Loja mediante a cisão. E, por essa via, a desmotivar a criação de fações, grupos, que se digladiem ou levem a cabo lutas por vão "poder".

Essencial para o funcionamento de uma Loja maçónica e o correto desenvolvimento do seu múnus é a tolerância, a aceitação das diferenças, a acomodação das divergências. Não se tem de estar de acordo com tudo nem com todos. Pode-se e deve-se, sempre que se entender que tal se justifica, expor opiniões diferentes, proclamar desacordos, apontar caminhos diversos. É no confronto de ideias, no pesar de escolhas, no aferir de sensibilidades que cada um afia e afina o seu pensamento, esclarece as suas dúvidas, determina o que e como deve investigar seguidamente. Uma Loja em que todos estivesse sempre de acordo, monótono coral de "yes men", seria um local de bocejante aborrecimento, condenado ao rápido desinteresse...

Mas precisamente porque uma Loja maçónica deve ser um local de debate livre, de fecundo confronto de ideias, é imperioso que tudo esteja organizado para que o debate, o confronto, não ultrapassem a fronteira da saudável controvérsia para o território da luta ideológica. Desde logo, todos e cada um interiorizando que os debates em Loja não se destinam a convencer o Outro ou ou outros ou um grupo dos demais, mas apenas e tão só a que cada um teste as suas próprias ideias, determine a valia dos seus argumentos, a força dos seus convencimentos, enfim, se convença a si próprio, quantas vezes pensando no fim do debate algo de subtilmente diferente daquilo que o convencia no seu início.

Mas o homem não é perfeito - e os maçons sabem que o não são: por isso buscam aperfeiçoar-se... Uma coisa são os princípios, outra, por vezes, a dura realidade, as paixões, os entusiasmos, a incapacidade de determinação do denominador comum às divergências, que as aplaine, suavize e permita a sua convivência harmoniosa. Por vezes, verifica-se que se cristalizam formas de pensar inconciliáveis, projetos de atuação incompatíveis. Nem sequer se trata de uma questão de maiorias ou minorias, pois uma minoria pode criar uma escola de pensamento, preferir um projeto, um e outro tão dignos como o pensamento e o projeto da maioria, só que diferentes entre si e não se podendo ambos em conjunto levar a cabo ao mesmo tempo.

Nestas situações - sempre possíveis de suceder - não é desejável e, portanto, não é admitido, que haja cisão, saída desordenada e conflituosa, antes que haja separação consensual, de forma a que o novo projeto se inicie sem desnecessários conflitos. Por isso severamente se ostraciza a "loja selvagem", para que ninguém se tente a constitui-la, antes todos e cada um tenham presentes que os conflitos, as divergências, a emergência de novos projetos, se gerem em harmonia, em diálogo e- sempre! - com o respeito das posições divergentes. Mais do que projetos conflituantes em competição entre si, interessa que haja projetos fecundos, pistas exploratórias de caminhos novos, coletiva e consensualmente assumidos e prosseguidos em espírito de cooperação. Assim, os êxitos srão saboreados por todos e os fracassos mais facilmente integrados e ultrapassados.

A GLLP/GLRP tem uma política de favorecimento de criação consensual de Lojas. Para isso, criou a figura de "Loja-mãe", a Loja que apadrinha a criação de uma outra - em regra, a Loja de onde é oriunda a maioria dos obreiros que se propôs avançar com um novo projeto.

A Loja Mestre Affonso Domingues tem uma cultura, que remonta ao seu início, de favorecer novos projetos. Por isso, nunca chega a ser uma Loja com um quadro de obreiros muito numeroso. Quando esse quadro comporta a criação de um novo projeto, sem detrimento do prosseguimento do da Mestre Affonso Domingues, normalmente esse novo projeto nasce, a inquietação saudável de uns quantos para trilhar uma nova vereda do caminho comum torna-se evidente - e, calma, ordenada e tranquilamente, a Loja apadrinha a criação de uma nova Loja e vê com orgulho e satisfação uns quantos dos seus, que ali se fizeram maçons e aprenderam a sê-lo, abalançarem-se à criação do seu ninho próprio. E a angústia da separação cede à satisfação de mais um dever cumprido, de mais uma emancipação, de um novo projeto, saído da nossa "escola de formação". A Loja Mestre Affonso Domingues tem prosseguido vários projetos ao longo da sua existência, uns com mais êxito, outros menos bem conseguidos, uns mais visíveis, outros mais modestos. Mas seguramente o projeto de maior consistência ao longo dos seus ainda poucos vinte e dois anos é o de ser formadora de maçons, incubadora de novas Lojas, favorecedora de ousadias, ninho  que periodicamente encoraja os seus residentes a voarem dele para fora.

Assim, a Loja Mestre Affonso Domingues tem várias Lojas Irmãs (não filhas, apesar de delas ter sido Loja-mãe...) por todo o País e obreiros por si formados na maior parte dos projetos da Maçonaria Regular portuguesa, em profícua sementeira que vai dando excelentes frutos...

Por isso, a Loja Mestre Affonso Domingues tem um lema muito próprio, que gostosamente aplica a todos os que partem, vão para onde vão, façam ou não o que fizerem ou não: uma vez da Mestre Affonso Domingues, sempre da Mestre Affonso Domingues! E rara é a sessão em que não recebe a visita de um ou mais dos que, tendo anteriormente integrado as suas colunas, agora prosseguem o seu trabalho noutros projetos!  Nem sequer são filhos pródigos: são apenas - e sempre - mais uns dos nossos!

Fonte:
 
Constituição de Anderson, 1723, Introdução, Comentário e Notas de Cipriano de Oliveira, Edições Cosmos, 2011, páginas 137-138.

Rui Bandeira

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